TOXICIDADE CRÓNICA
O consumo crónico de etanol em altas doses causa lesão a nível cerebral, hepático, cardiovascular, pancreático, renal e, também, do trato gastrointestinal, levando a disfunções fisiológicas [43].
[1] Ansari, R.A., K. Husain, and S.A.A. Rizvi,. Role of Transcription Factors in Steatohepatitis and Hypertension after Ethanol: The Epicenter of Metabolism. Biomolecules, 2016. 6(3): 29.
[40] Disponível em: https://themedicalbiochemistrypage.org/ethanol-metabolism.php. Acedido a: 17/04/2017
[43] National institute on alcohol abuse and alcoholism, Number 63, October 2004. Disponível em: https://pubs.niaaa.nih.gov/publications/aa63/aa63.htm. Acedido a: 03/05/2017
[44] Disponível em: https://www.collegedrinkingprevention.gov/specialfeatures/interactivebodytext.aspx. Acedido a: 30/04/2017
[45] Kazim Husain, et al. Alcohol-induced hypertension: Mechanism and prevention. World journal of Cardiology. 2014; 26; 6(5): 245-252.
[46] Samantha M. Simet and Joseph H. Sisson. Alcohol’s Effects on Lung Health and Immunity. Alcohol Res. 2015; 37(2): 199–208.
[47] Bujanda L. The effects of alcohol consumption upon the gastrointestinal tract. Am J Gastroenterol. 2000; 95(12): 3374-82.
[48] Minoti V. Apte. Alcohol-Related Pancreatic Damage Mechanisms and Treatment. Alcohol Health & Research World. 1997; Vol. 21, no.1.
A metabolização do etanol está associada a alterações metabólicas no fígado. O fígado gordo (esteatose hepática) é a resposta mais comum do organismo ao consumo moderado ou prolongado de álcool, fazendo aumentar os níveis de ácidos gordos hepáticos e triglicerídeos no sangue [1].
O metabolismo hepático do etanol resulta na geração de grandes quantidades de NADH citosólico e mitocondrial levando a interrupções nos processos metabólicos normais do fígado. Ocorre diminuição da gluconeogénese, levando a hipoglicémia potencialmente grave. Há um aumento da produção de lactato, que por sua vez, resulta em excesso de fornecimento de lactato ao sangue e consequente acidémia láctica [40].
A taxa de fluxo sanguíneo através dos rins é rigorosamente controlada de modo a que o plasma possa ser filtrado, e substâncias que o corpo precisa, como os eletrólitos, possam ser reabsorvidas. A doença hepática estabelecida prejudica este equilíbrio, aumentando ou reduzindo as taxas de fluxo do plasma e a filtração através do glomérulo.
Uma das principais funções dos rins é regular tanto o volume, como a composição do fluido corporal, incluindo os eletrólitos, como o Na+, o K+ e o Cl-. No entanto, o efeito diurético do álcool faz com que haja aumento do volume de urina, provocando desidratação e alterações no equilíbrio eletrolítico [40,44].
Após a ingestão, o álcool percorre o esófago até ao estômago, onde parte dele é absorvido para corrente sanguínea. O álcool não absorvido continua a mover-se através do trato gastrointestinal e pode ficar no estômago causando irritação, pois aumenta os sucos digestivos que são secretados [44].
O álcool facilita o desenvolvimento da doença de refluxo gastroesofágico, reduzindo a pressão do esfíncter esofágico inferior, bem como a motilidade esofágica. As bebidas alcoólicas fermentadas e não destiladas aumentam os níveis de gastrina e a secreção ácida. O ácido succínico e maleico contido em certas bebidas alcoólicas também estimulam a secreção ácida. O álcool facilita o desenvolvimento de gastrite superficial e gastrite atrófica crónica. As principais alterações intestinais relacionadas ao álcool são diarreia e má absorção, com recuperação após restabelecimento de uma dieta normal [37].
O pulmão é afetado negativamente pelo abuso de álcool. Indivíduos que consomem em excesso são mais propensos a desenvolver pneumonia, tuberculose, infeção por vírus respiratório sincicial e síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA). O aumento da suscetibilidade a estas e outras infeções pulmonares, nestes indivíduos, é devido à resposta imune debilitada que apresentam [46].
O efeito do álcool no pâncreas não permite que as enzimas sejam enviadas para o intestino delgado para metabolizar os alimentos. Assim, o pâncreas passa segregar os seus sucos digestivos internamente, ao invés de enviar as enzimas para o intestino delgado. Essas enzimas, bem como o acetaldeído são prejudiciais ao pâncreas.
O consumo excessivo e prolongado faz com que este processo seja repetido podendo causar inflamação, bem como inchaço dos tecidos e vasos sanguíneos. Esta inflamação é chamada pancreatite, e impede o pâncreas de funcionar corretamente. Com o consumo excessivo contínuo, a inflamação pode se tornar constante. Esta condição é conhecida como pancreatite crônica [44,47].
O consumo crónico enfraquece o músculo cardíaco, causando uma condição chamada cardiomiopatia alcoólica. Um coração enfraquecido não consegue se contrair efetivamente. Como resultado, não pode bombear sangue suficiente para nutrir suficientemente os órgãos. Em alguns casos, esta escassez de fluxo sanguíneo causa danos graves aos órgãos e tecidos [44].
O álcool perturba o sistema de marcapasso do coração e faz com que bata muito rapidamente ou irregularmente, ou seja, provocando arritmias [44].
Também pode causar hipertensão. Apesar de ainda não se encontrar bem elucidado, o mecanismo pelo qual a ingestão crónica de etanol causa hipertensão inclui um desequilíbrio do sistema nervoso central, comprometimento dos barorrecetores, aumento da atividade simpática, estimulação do endotélio para libertação de endotelina, aumento dos níveis de cortisol, inibição da produção de óxido nítrico dependente do endotélio e estimulação do sistema renina-angiotensina-aldosterona [45, 48].
Podem surgir défices cerebrais que persistem muito depois que o indivíduo consiga a sobriedade. O álcool pode ter efeitos extensos e de longo alcance sobre o cérebro, que vão desde simples falhas na memória até condições permanentes e debilitantes [29].
A doença hepática alcoólica pode também danificar o cérebro. No fígado o álcool é metabolizado libertando produtos tóxicos que danificam as células hepáticas. Estas células hepáticas danificadas já não funcionam tão bem como deveriam e permitem que muito dessas substâncias tóxicas, como a amónia e o manganês, se desloquem para o cérebro. Estas substâncias danificam as células cerebrais, causando um transtorno cerebral grave e potencialmente fatal, a encefalopatia hepática. A encefalopatia hepática causa distúrbios do sono, mudanças de humor e personalidade; ansiedade; depressão; intervalo de atenção reduzido e problemas de coordenação [40].
O álcool pode afetar o cérebro em qualquer fase do desenvolvimento, mesmo antes do nascimento. Os transtornos causados a nível fetal podem ser problemas físicos, de aprendizagem e comportamentais e outros defeitos que resultam da exposição pré-natal ao álcool [40].